Escrito por Sulivan França - 17 de Junho de 2019

No início dos anos 2000, o Rhode Island Hospital era tido como uma das melhores instituições médicas dos EUA. Ao mesmo tempo, tinha fama de ser um local com muita tensão entre médicos e enfermeiros. Com o passar dos anos, as inimizades entre as duas categorias foram gerando rotinas e hábitos improvisados. Isso, sobretudo, da parte dos enfermeiros, que se sentiam menosprezados por muitos médicos. No fim, como se viu, este caminho acabou causando erros terríveis. 

Em 2007, de forma arrogante, um cirurgião ignorou o protocolo e os alertas de um enfermeiro durante um procedimento de emergência. Com isso, acabou por operar o lado errado da cabeça de um paciente de 86 anos. Ao perceber o erro, a equipe correu para realizar a cirurgia no lado correto. Duas semanas depois, porém, o idoso acabou morrendo e a família responsabilizou o hospital pelo erro. O Rhode Island acabou processado e o médico, proibido de trabalhar no local. 

Faça um teste: Reflita sobre os hábitos nas empresas onde você já trabalhou. Quais eram positivos e quais eram negativos? O que você poderia sugerir para melhorar o ambiente?

Mas será que o que ocorria naquele hospital é algo raro? Publicado em 1982, o livro "Uma Teoria Evolucionária da Mudança Econômica", de Richard Nelson e Sidney Winter, fez barulho. Ele pregava o seguinte. Numa primeira vista, parece que um empresa faz escolhas racionais e planejadas, certo? Na prática, porém, elas são guiadas por hábitos acumulados ao longo de sua história e por padrões que muitas vezes surgem dar decisões independentes de milhares de empregados. É o caso dos enfermeiros que foram criando seus próprios códigos para conseguirem trabalhar com médicos que os tratavam mal.


Ainda segundo o livro, empresas não são como famílias, apesar do senso comum. Na verdade, estão mais para campos de batalha numa guerra civil, com pessoas ou grupos competindo por poder e crédito. Mas, mesmo com vocação para o conflito interno, a maioria das organizações segue funcionando em relativa paz, ano após ano. Como? Por meio de rotinas, ou hábitos, que representam tréguas. São elas que permitem que todos deixem suas hostilidades de lado por tempo suficiente para que o trabalho seja feito. 

Na maior parte do tempo, isso funciona. As rivalidades seguem existindo, mas, devido aos hábitos institucionais, são mantidas dentro de limites e a organização avança. Mas, em outros momentos, a trégua é insuficiente, como no caso do Rhode Island Hospital. E a paz instável pode ser tão destrutiva quanto uma guerra. No hospital, os enfermeiros cediam para que a trégua ocorresse. Suportavam atos deploráveis de alguns médicos. No entanto, chegou uma hora que tudo aquilo implodiu. 

Faça um teste: as tréguas permitem que a empresa funcione apesar das hostilidades entre pessoas ou áreas. Pense nas tréguas que você observou nas empresas por onde passo? 

Outro exemplo que vale de alerta é o do Metrô de Londres, uma organização dividida em quatro grandes áreas, e que cultivou o hábito de não trocar informações entre elas. Tal atitude se mostrou trágica em 1987. Numa noite, um dos funcionários da bilheteria foi alertado por um passageiro que viu um lenço de papel pegando fogo, próximo de uma escada rolante. Prontamente, o funcionário foi ao local, apagou o lenço, e voltou ao seu posto. Não comunicou nenhuma outra área ou telefonou para os bombeiros, pois existiam regras rígidas que determinavam que isso só poderia ser feito com autorização de um superior. 

Também não investigou o incidente, já que ele não era do setor de segurança, e as normas eram claras sobre as responsabilidades de cada área. Porém, como se verificou depois, o lenço de papel era o indício do início de um incêndio. E a atitude do funcionário, preso às regras, foi sucedido de uma série de decisões que escancararam como os setores do Metrô londrino não eram integrados. O resultado disso foi um saldo de 31 mortos e dezenas de feridos, quando as chamas se alastraram. As tréguas entre os setores do Metrô faziam a organização funcionar, mas o incêndio mostrou que é preciso haver alguém no comando diante de uma situação de crise. 

Crises, no entanto, representam oportunidade para mudar. No Rhode Island Hospital, diante de uma série de erros médicos, uma nova administradora conseguiu implementar mudanças que antes causavam muita resistência. Foram instaladas câmeras de vídeo nas salas de cirurgia para garantir que intervalos previstos fossem respeitados. Checklists tornaram-se obrigatórios e foi criado um sistema em que qualquer funcionário poderia relatar de forma anônima problemas que pusessem em risco a saúde dos pacientes. Com tudo isso, o lugar passou a ter um ambiente de cooperação. 

Já no Metrô de Londres a cultura teve de ser totalmente reformulada após a tragédia. Atualmente, cada estação possui um gerente de segurança e cada funcionário tem a obrigação de informar mesmo sobre o menor indício de risco. 

Uma organização com hábitos disfuncionais não muda do dia para a noite apenas porque um líder manda. Porém, executivos atentos aproveitam uma crise, ou criam a percepção de uma crise, e cultivam a sensação de que algo precisa mudar. Por tudo isso, nunca se deve desperdiçar uma crise. 

Faça um teste: como você reage diante de uma crise, seja pessoal ou profissional? Você já experimentou aproveitar o momento de uma crise como uma oportunidade para mudar?

Mas se vimos que existem organizações que ainda pecam no que se refere à gestão da informação, por outro lado, há outras que lucram a partir do uso que fazem de dados. Em alguns casos, de uma forma até questionável. 

A Target, uma rede varejista dos EUA, utiliza um volume infindável de informações que detém sobre os hábitos de seus clientes em ações de marketing. Isto serve para identificar hábitos dos consumidores e antecipar suas ações além de lhes direcionar cupons de ofertas ou desconto em produtos. A empresa está longe de ser a única a praticar isso, mas se destaca pelo uso que faz de ferramentas de bases de dados. 

A partir dos padrões de compras de clientes, a Target se tornou capaz, inclusive, de identificar quais as chances de uma consumidora estar grávida. Quando uma ida às lojas passava a incluir produtos como vitaminas, loção ou sabão sem perfume, suplementos com magnésio, cálcio e zinco, tudo em grandes quantidades, isso era detectado pelos analistas de dados da empresa. E centenas de milhares de mulheres que compravam na Target estavam fazendo isso. 

Logo, a companhia estava diante de uma mina de ouro. Bastava atraí-las com descontos em fraldas ou uma infinidade de produtos para mamães e bebês. Porém, antes de partirem para a ação, alguém da empresa considerou uma coisa. A maioria dessas mulheres poderia ficar incomodada ao receber uma propaganda que deixasse claro que a Target tinha informações que muitas vezes elas só haviam divulgado para familiares e amigos próximos. 

Para driblar qualquer mal estar, a empresa fez alguns testes e, por fim, decidiu enviar catálogos de ofertas onde fraldas ou roupas infantis com desconto apareciam ao lado de produtos que mulheres grávidas não comprariam, como taças de vinho ou cortadores de grama. Deste modo camuflado, parecia que todos os produtos haviam sido escolhidos ao acaso. Vale a reflexão sobre como nossos dados vêm sendo coletados atualmente.

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