Nas sessões de coaching, quando falamos sobre os valores que governam as decisões, sempre que alguém destaca a liberdade como seu principal valor, costumo perguntar: o que significa Liberdade para ele e geralmente ouço que Liberdade é fazer o que deseja sempre que quiser. Mas neste conceito mora um grande equívoco: o de enxergar a felicidade como o acúmulo de desejos e apetites saciados ou o estado de constante euforia. Para entender melhor este equívoco, primeiro é necessário explorar a diferenciação entre desejo e vontade proposta pelo filósofo Immanuel Kant, no livro “A Crítica da Razão Pura”, interpretada aqui por mim numa linguagem mais simples.

Desejo é impulso instintivo, é tudo que está ligado diretamente à uma ideia de recompensa ou sensação de prazer imediatos e passageiros, é um querer sem controle. 

Vontade é a racionalização e administração do querer, é a superação do instinto em prol de resultados mais significativos e recompensas menos imediatistas e superficiais, ponderando consequências, no intuito de se viver melhor.

O Desejo é autoritário e urgente. Está associado às necessidades físicas e químicas como, por exemplo, ao aprisionamento dos vícios, sejam eles relacionados a drogas lícitas ou ilícitas, comidas, doces, jogos, compras, redes sociais, vaidades, etc. A Vontade carrega o respeito aos limites do corpo, da mente, do outro, da ética e está associada à liberdade inserida no planejamento e na disciplina que conduzem ao controle da própria vida.

O que diferencia os homens dos outros animais é a sua capacidade de pensar para agir e fazer escolhas, ou seja, o seu livre arbítrio. Mas o livre arbítrio só pode ser entendido como liberdade quando, diante dos desejos, a vontade impera.

Quando os nossos instintos e emoções nos impelem à fazer algo que possa prejudicar o outro ou à nós mesmos como, por exemplo, quando sentimos o desejo de agredir alguém que nos irrita, de comer em excesso, de ceder à investidas sexuais extraconjugais ou de trocar o trabalho pela praia numa segunda-feira, é a nossa vontade que negocia com o nosso desejo em prol da ética, da boa convivência, da nossa segurança financeira, da nossa integridade física e mental e dos nossos objetivos de vida mais relevantes.

A ideia aqui não é adotar uma vigilância castradora, mas buscar o autoconhecimento. Porque se não conhecermos as nossas próprias fraquezas, essa negociação deixa de acontecer e nos tornamos escravos dos nossos “apetites”. 

Liberdade não é fazer o que se deseja, mas é ter a competência de deliberar contra estes desejos e comandar a própria existência.

É deixar que a reflexão sobre si mesmo imponha os seus limites de conduta. É usar com sabedoria a angustiante dádiva do poder de escolha. Porque livre mesmo é quem sabe escolher!

 
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