Dentre cerca de 190 milhões de habitantes, desse número, 12 milhões de pessoas passam, diariamente, horas estudando para, quem sabe, chegar um dia ao topo do Olimpo: a tão sonhada aprovação em um concurso público. Esta é a vida dos "concurseiros". O Brasil, infelizmente, vive uma gangorra econômica há décadas, cheia de altos e baixos, fazendo com que vários profissionais busquem sua independência financeira e estabilidade por meio dos certames.

Este rascunho é provocativo, reflexivo, informal e é dirigido àqueles "concurseiros" que, devido às circunstâncias cotidianas, buscam passar em um concurso, mas nunca se perguntaram se o concurso almejado trará, de fato, felicidade. Caso você seja um desses, lhe digo, busco te induzir a ponderar sobre uma pergunta: Passei em num concurso. E agora?

É notório que a trilha para aprovação em um certame é longa e desgastante. Sacrifícios financeiros, familiares e pessoais são feitos até a jornada de aprovação no tão sonhado concurso.  

Pois bem, acho que já está na hora de falar um pouco sobre mim. Meu nome é Ricardo Santos, ocupo o cargo de Procurador Federal desde 2002, já residi em Caxias do Sul, Brasília, Natal, Recife, Piracicaba e, por fim, na minha amada Petrolina/PE.

Ao longo destes anos como membro da Advocacia Geral da União (AGU), morando em tantos lugares, conheci muito juízes federais e estaduais, membros do Ministério Público Federal, do Ministério Público do Trabalho, da Defensoria Pública da União, analistas do judiciário, analistas e técnicos do INSS, analistas da Receita Federal etc. A lista é longa. A síntese deste parágrafo é dizer que convivi com muitos servidores que ocupam cargos que, provavelmente, você está estudando para passar. Relato para você, sem medo, que dezenas deles são infelizes, extremamente amargurados profissionalmente, muitos, inclusive portadores de vários distúrbios psicossomáticos (depressão, insônia crônica, gastrite, síndrome de Burnout etc). 

Nessa trajetória, particularmente, três pessoas me chamaram atenção. Para narrar estas histórias usarei nomes fictícios, por respeito aos colegas e total irrelevância na individualização destes.

Pois bem, Renata fora aprovada numa das primeiras colocações para o cargo de juíza estadual. Desempenho incrível do início ao fim do certame. Assisti a sua prova oral e foi um show. Ocorre que, após um pouco mais de ano de magistratura, Renata, surpreendentemente, pediu exoneração do cargo, ficando desempregada. Posteriormente, passou a ocupar outro cargo público sem tanto “status”, embora tornará-se mais feliz.

Joaquim, extremamente inteligente, ao ser empossado no cargo de delegado da polícia civil, foi festejado como orgulho da família. Era um cargo de “cabra macho”, como diz aqui no Nordeste. Poucos meses depois, também exonerou-se do cargo, passando, igualmente, a categoria de desempregado.

Por fim, a história de Josefa não foi diferente. Todavia, com mais alguns percalços. Pois bem, Josefa tomou posse comigo, em 2002, no cargo de procuradora federal, porém não gostava da função. Aproveitando que tivera sido chamada no concurso para Delegada da Polícia Federal, aventurou-se no cargo. Todavia, também não se adequou a esta posição. Por fim, Josefa assumiu o cargo de analista do TRT. A última notícia que tive dela foi que tinha cursado Psicologia e estava muito satisfeita com sua nova profissão.  

Talvez você esteja pensando que estas pessoas possuíam pais ou companheiro(a) ricos e não precisava da remuneração, que trabalhavam por esporte. Engano seu, todos eram integrantes da classe média e estudaram anos para passar nos concursos citados.

O que estas pessoas tinham em comum? Coragem? Irresponsabilidade? Pensar sob esta ótica é irrelevante para o nosso case. Para mim, o que elas tinham em comum era uma angústia aguda extrema, daquelas que obrigam a tomar uma atitude de qualquer forma. Não se iludam, deixar um emprego público bem remunerado é algo que pouquíssimas pessoas fazem e lhes garanto que deixa cicatrizes.

Espero não ser enfadonho, só enfatizarei estes três casos, contudo conheci dezenas de servidores público frustrados. O foco da questão é descobrir a causa da infelicidade no serviço público.

Dizer que existe uma causa para o abalo da saúde psíquica de incontáveis servidores públicos seria irresponsável da minha parte. Existem dezenas de motivos, mas não serão objeto deste escrito.

Serei cirúrgico, e irei me ater uma causa específica: a escolha errada do cargo. Ou seja, muitos candidatos não possuem perfil para ocupar os cargos os quais foram aprovados.

No meu escritório, já escutei várias e várias vezes os clientes dizendo, “quero passar em um concurso, que pague razoável, qualquer um que seja”.

De acordo com os relatos lavrados, você, ainda, entende que a afirmação supracitada procede? Ora, ser empossado em um concurso público significa dizer que você irá desempenhar uma função específica durante cerca de 30 anos da sua vida. Destaco que estou me dirigindo àqueles que na gíria dos "concurseiros" dizem que “este é o meu concurso fim”. Traduzindo, não irão mais prestar concurso para cargo algum.

Nestes casos, recomendo, fortemente, que você responda as perguntas abaixo, antes de pensar que qualquer concurso serve:

1 - Fazer isso te dará inspiração todos os dias?

2 - Você sente uma capacidade especial para fazer isso?

3 - Será que fazer isso é algo natural, sem demandar um grande esforço?

4 - Gostaria de fazer isso durante uns 30 anos?

5 - Mesmo que você não recebesse um centavo, você ainda faria isso? 
Transforme sonhos em realidade

Caso alguma resposta tenha sido negativa, aconselho você a trabalhar a cognição dos seus talentos, valores, propósito de vida, forças, fraquezas e descobrir quais funções irá desempenhar. Senão, é possível que você passe a pertencer ao grupo de pessoas que tem “sucesso”, mas iniciam a semana pensando: “não vejo a hora da sexta-feira chegar, espero que a semana passe rápido”.

Lembre-se,  sucesso sem felicidade é igual a fracasso!

Para os leitores que chegaram ao final deste artigo, sinceramente, peço que façam uma autorreflexão, sob pena de traçarem metas equivocadas, ou que sequer sejam realmente suas, e terem que arcar com um preço bastante elevado por isso. 

“Dizem que a vida é para quem sabe viver, mas ninguém nasce pronto. A vida é para quem é corajoso o suficiente para se arriscar e humilde o bastante para aprender.” (Clarice Lispector)



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