O tema liderança é tão recorrente e atual no ambiente das organizações, que anima e instiga a produção de literatura, artigos e publicações, fóruns executivos, palestras e todo o tipo de debate por parte de grupos estudiosos e atuantes na área de gestão. Está “na crista da onda” discutir o modelo de liderança mais atual e em evidência, mais eficaz e mais ergonômico para as empresas modernas. É fato que o conceito de liderança vem mudando e se reciclando ao longo dos anos. O seu significado, seu novo formato e a sua revitalização nas empresas devem ser repensados assim como se repensa um novo produto para a próxima temporada, uma nova coleção, com novidades, diferenciação e até sofisticação, sem perder a sua essência e objetivos. Porque o tempo passa e as coisas mudam muito rapidamente. Se os líderes de hoje que estão na faixa etária dos 30 aos 40 anos, pensam de forma diferente dos de amanhã que vivem seus “vinte e poucos anos”, o que se poderá dizer então dos que têm mais de 40 anos?
Quando o assunto é gestão e liderança, “o Brasil é um dos piores países”, segundo a revista Você S.A. (Junho 2013), perdendo apenas para a Índia. O problema maior apontado é a centralização, que advém justamente do despreparo do gestor brasileiro, do medo de errar, diante da expectativa da empresa (acionista) de resultados sempre melhores, por vezes até inatingíveis, dependendo do cenário em que se encontra. O recurso mais disponível que este gestor possui é dar ordens, o que o torna centralizador e autoritário, ou seja, não é o que se vislumbra em um líder/gestor moderno.
Na transição do cargo, o gestor centralizador e autoritário em exercício escolhe para ser seu sucessor aquele com quem tem mais afinidade e na hora de promover alguém, acaba optando por quem tem o perfil mais parecido com o seu próprio. O resultado é endógeno, não há renovação, mas sim um efeito dominó de um modelo de liderança incapaz de fabricar bons novos líderes, que já não atende o que as empresas e o mundo moderno exigem.
Como líder atuante na empresa onde trabalho, escrevi este artigo com o objetivo de contribuir e propor reflexões sobre o nosso “jeito” de liderar. Dado a isto, à luz e inspiração do que disse Nizan Guanaes “Caminhe sempre com um saco de interrogações numa mão e uma caixa de possibilidades na outra”, é preciso questionar:
Como está desenhada a matriz de liderança das empresas?
Os líderes sabem o caminho a seguir?
Temos um plano estratégico para atingir nossos objetivos, metas para o próximo ano e para daqui a cinco anos?
As metas são claras, mensuráveis, factíveis e motivadoras?
Os investimentos nas lideranças são compatíveis para sustentar o crescimento que buscamos?
As nossas ações do dia a dia estão dentro da linha estratégica desenhada?
O nível de influência das antigas lideranças é adequado e contributivo para a gestão moderna?
O gestor/líder está apoiado e fortalecido em seu papel?
Como respaldo e contribuição a estas reflexões e questionamentos, é oportuno trazer os resultados de uma pesquisa apresentada na revista Exame de agosto/2014. A referida pesquisa aborda o tema liderança em sua matéria principal, intitulada “As melhores fábricas de Líderes”, um levantamento que mostra quais são e o que fazem as empresas que mais formam os próprios líderes no Brasil. As dez empresas estudadas (em ordem alfabética) foram: 3M, Ambev, Arcelormittal, Caterpillar, Dow, EDP, Gerdau, J&J Medical, Novartis e Unilever.
Mas quais são as iniciativas das “dez mais” para fabricar estes líderes, segundo a matéria?
1- Aproximam o topo da base
A principal estratégia utilizada é a da aproximação dos diretores e presidentes na seleção dos candidatos a trainee, atuando fortemente e diretamente como mentores destes candidatos. Na Dow, o que se deixa bem claro é que o topo está de olho em quem está chegando. Há uma espécie de apadrinhamento, orientando e planejando a trajetória do profissional e facilitando a sua adaptação à cultura da empresa.
2- Jogam aberto - para o bem e para o mal
As expectativas de quem busca o crescimento devem ser claras, quanto ao que vai encontrar, o tempo que irá levar. Na 3M, a ascensão profissional não ocorre de forma meteórica e quem quer crescer, não pode ter pressa. A política de retenção de talentos não está alicerçada apenas em dinheiro, mas em entrega de resultados (Unilever). Na Ambev, a transparência é imperativo e não há sustos no desligamento, quando os resultados não são entregues. Para isto, as metas são claras, quantitativas e qualitativas, desafiadoras, mas factíveis, para que possam ser buscadas como motivação e ânimo nas doses certas.
3- Ensinam a liderança antes de assumir cargos de responsabilidade no futuro
Segundo o estudo, treinar as habilidades de liderança antes mesmo de assumir cargos de responsabilidade é prática e realidade de poucas empresas. Em entrevista com mais de 4300 executivos de grandes empresas do Brasil, apenas 14% tiveram algum treino antes de assumir um cargo de liderança. Entretanto, nas dez empresas pesquisadas, 100% fazem esta preparação como um “aquecimento” antes de um executivo assumir um cargo de liderança.
4- Deixam claro o que se espera de cada um
A Ambev e a Gerdau são destaques na metodologia da meritocracia. Ambas empresas possuem metas claras que permitem identificar talentos que se quer reter e apostar. Na Johnson & Johnson, as datas das reuniões de avaliação estão escritas no verso dos crachás dos avaliados para as cinco reuniões que ocorrem durante um ano para avaliação das metas e o impacto nas carreiras.
5- Definem quem pode ocupar qual posição - e aceleram o caminho
Outra pesquisa feita em 112 grandes empresas, revela que 76% tem plano de sucessão para os cargos de gerência, porém tudo indica que não conseguem colocá-lo em prática, somente está no papel. No grupo das dez maiores, mais uma vez, esta realidade é diferente. Tanto a Novartis quanto a ArcelorMittal, têm planos de sucessão definidos, analisam periodicamente, identificam os potenciais, investem na preparação dos funcionários e desenham planos de carreira com horizonte de tempo de até cinco anos.
6- Criam grupos de avaliação
As “dez mais” evitam que o julgamento do desempenho do profissional caia na subjetividade de uma pessoa somente, o seu líder direto. Praticam a avaliação 360 graus, onde tanto o superior imediato, quanto os pares e subordinados e áreas com as quais se relaciona participam do processo avaliativo. Na Johnson & Johnson existe um comitê que avalia a atitude do executivo para temas como abertura, colaboração e poder de mobilização.
7- Oferecem experiências novas
As empresas, mesmo diante de períodos de crise, entendem que “não é inteligente suspender os treinamentos tradicionais quando a economia vai mal” e “seguram a onda”, concedendo promoções, aumentos, incentivos, cursos, programas de motivação aos seus executivos, como o crescimento profissional, para que tenham a percepção de que continuam se desenvolvendo.
Um dado final da pesquisa, mas não menos importante, se refere ao aumento no número de executivos que não têm uma empresa dos sonhos, de 34% em 2012 para 50,4% em 2014. Entenda-se “empresa dos sonhos” aquela, que na opinião dos executivos, promove o crescimento e desenvolvimento profissional genuínos.
Transforme sonhos em realidade
Finalizando esta reflexão, as dez gigantes apresentadas na pesquisa da Exame não viraram fábricas de líderes da noite para o dia. Como exemplo, a história de Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, relatada no livro “Sonho Grande”, mostra a trajetória não só da Ambev (relatada na pesquisa da Exame) como das outras empresas adquiridas por estes empresários, no estilo de gestão que foi construído em quatro décadas, com erros e acertos ao quais se permitiram, mas sempre apoiados em três pilares: a meritocracia, o corte de custos e a melhoria contínua.
Muito embora se tratem de gigantes, as iniciativas para a formação de líderes tomadas por estas empresas, seja em conjunto ou cada uma a seu tempo, servem de inspiração para toda a empresa que deseja também pertencer a este pelotão de elite, grupo seleto, ou qualquer outro adjetivo que melhor convenha.
O primeiro passo é saber onde se quer chegar e qual o tamanho do sonho. Sabendo isto, ter metas claras, meios e planos de ação para atingimento destas metas. E a cada etapa cumprida, um novo plano, uma outra etapa, pois como nos ensina Sêneca: “Não existe vento favorável para o marinheiro que não sabe aonde ir.”


Informamos que esse texto é de inteira responsabilidade da autora identificada abaixo.

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Valéria Siebel

Life Coach

Profissional com mais de vinte anos de experiência em gestão de empresas, formação na área contábil, especialização em finanças e controladoria, Mestre em Controladoria e Finanças, docente da FANS - Faculdade de Nova Serrana, MG.